Nova lei dificulta o registro de pessoas inadimplentes e prejudica os consumidores
Obrigação da carta com AR traz custos extras ao devedor, aumento da burocracia e exposição pública da dívida. Com base de dados afetada, SPC Brasil suspende a divulgação do Indicador de Inadimplência nacional e da região Sudeste
Mensalmente, a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) divulgam os dados de inadimplência nacional e regional. Porém, desde setembro a lei paulista nº 15.659, conhecida como Lei do AR (Aviso de Recebimento) tem impossibilitado e prejudicado o registro de novos brasileiros inadimplentes na base de dados dos birôs de crédito e, com isso, o SPC Brasil anuncia a suspensão das divulgações dos indicadores nacionais e da região Sudeste, por tempo indeterminado, devido a grande participação dos dados de São Paulo para ambos os percentuais.
“O SPC Brasil considera a nova lei prejudicial para o bom funcionamento do mercado de consumo no país, uma vez que com informações escassas a respeito da inadimplência, haverá maior dificuldade para análise dos riscos da concessão de crédito, incidindo em maiores taxas de juros para os consumidores”, diz o presidente do SPC Brasil, Roque Pellizzaro Junior.
“A lei paulista se propõe a proteger o consumidor no procedimento de inclusão de seu nome no cadastro de inadimplentes, mas o efeito da medida é reverso, pois a lei acaba estimulando o credor a ir protestar a dívida em cartório quando o AR não for assinado. Neste caso, além da burocracia, o consumidor terá de pagar não somente o valor da dívida atrasada, mas também arcará com taxas e demais encargos cobrados pelos cartórios para a baixa da dívida”, afirma.
A lei em questão, proposta pelo ex-deputado estadual Rui Falcão e atual presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), obriga o envio de carta com aviso de recebimento para o devedor antes da inclusão de seu nome na lista de inadimplentes e demanda a assinatura do AR para ser registrado nos birôs de crédito. Anteriormente, a lei foi vetada pelo governador de São Paulo, por entender que é inconstitucional, mas agora segue para avaliação do Supremo Tribunal Federal para uma decisão definitiva. É importante salientar que mesmo sem o AR os birôs de crédito já enviam a carta simples avisando o consumidor que terá seu nome incluído nos cadastros há mais de 20 anos, com alta taxa de eficiência. Ao receber a carta simples, o consumidor tem dez dias corridos para quitar o débito ou entrar em negociação com o credor para evitar a inscrição no cadastro de inadimplentes.
Com o aviso de recebimento, a nova lei impõe um modelo sete vezes mais caro, que não pode ser pago pela maioria dos setores econômicos, principalmente o das pequenas empresas e o das concessionárias de serviços públicos. Em setembro e outubro, a carta com AR foi usada por poucas empresas e teve comprovada sua ineficiência: 30% das correspondências enviadas com AR voltaram sem assinatura. “Com o AR, o consumidor de má-fé pode se negar a receber a comunicação do SPC, impedindo sua inclusão nos cadastros de inadimplentes, causando distorção e insegurança no mercado de crédito”, afirma Pellizzaro.
Além da questão da má-fé, com a obrigatoriedade da assinatura do aviso de recebimento, os Correios terão dificuldades para localizar consumidores que não estão em suas residências no período comercial. “Se o consumidor se esqueceu de pagar determinada conta e passa o dia inteiro trabalhando e não está em casa no momento em que o carteiro passa, ele não vai receber e nem assinar a carta. Muito provavelmente, esse consumidor, só vai descobrir que está negativado quando tiver algum problema para obter crédito”, explica o presidente do SPC Brasil.
Aumento da burocracia e a exposição pública da dívida
A nova lei paulista, ao isentar a obrigação de envio da carta AR para dívidas previamente protestadas em cartório, estimula o protesto. Esse incentivo gera burocracia e aumenta os custos ao consumidor no processo de “limpar” o nome.
Com o protesto, o devedor terá que se deslocar fisicamente até ao cartório, perdendo tempo e mais dinheiro para baixar o protesto, ao invés de simplesmente pagar a conta. Antes da lei, “limpar” o nome nos cadastros de inadimplentes era automático com a quitação da dívida, sem taxas nem burocracia. Contudo, a quitação da dívida que foi protestada em cartório implica em exposição pública da dívida: o cartório enviará uma carta ao consumidor sobre a dívida em atraso; se não o encontrar, publicará o protesto no jornal. Assim, o consumidor será exposto publicamente e protestado mesmo que não seja encontrado.
O registro da dívida nos cartórios obriga o consumidor a pagar, além da dívida com o credor, taxas para ter seu nome limpo dos registros de cartórios, que no Estado de São Paulo varia em torno de 10% do valor protestado, mas pode ser ainda maior. Ou seja, se um consumidor tem uma dívida de R$ 15 mil e a mesma seja protestada, ele terá de pagar não apenas a integralidade do valor devido à empresa credora, como também arcará com mais R$ 1,5 mil em encargos junto ao cartório.
Número de inadimplentes cresce mais no Nordeste
Devido a grande participação da região Sudeste, que concentra o maior número de devedores do país, aproximadamente 23,75 milhões de pessoas inadimplentes, de acordo com a estimativa de setembro, o SPC Brasil paralisa as divulgações dos dados nacionais e desta região a partir de outubro, por tempo indeterminado. As demais regiões terão seus dados divulgados – pelo menos até que sejam afetadas pela lei do AR, já que há planos para que seja estendida além do estado de São Paulo. Estados como Minas Gerais, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Rondônia, Piauí e Ceará já possuem projetos semelhantes em tramitação nas Assembleias Legislativas.
De acordo com o indicador regional apurado pelo SPC Brasil e pela CNDL, em outubro o Nordeste foi a região que liderou o crescimento do número de inadimplentes, na comparação com o mesmo mês do ano passado, com variação de 7,97%; seguido do Centro-Oeste (7,11% – a maior variação já apresentada pelo indicador na região); o Sul (6,72% – segunda maior variação desde junho de 2012) e o Norte (5,97%).
Sobre a CNDL:
Fundada em 1960, a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) é a mais antiga entidade representativa do comércio lojista, reunindo as federações (representação local nos estados) e as câmaras de dirigentes lojistas (representação local nos municípios).